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A serviço do pré-natal, o “boom” das tecnologias


Fonte: Jornal Arauto
Publicado 10/07/2021 09:30

Geral   EVOLUÇÃO

Basta o teste de gravidez dar positivo que os papais iniciam uma série de especulações sobre as características da criança. Será menino ou menina? Terá cabelo castanho ou loiro? Vai se parecer com quem? É saudável? Se há cerca de 20 anos, o sexo do bebê era conhecido apenas quando nascia, hoje, com oito semanas as gestantes podem fazer um teste de sangue e fazer a descoberta precocemente. Tratam-se das evoluções tecnológicas – mais fortemente nos últimos 10 anos - utilizadas a favor da assistência pré-natal que, além de auxiliarem a saber se é menino ou menina, proporcionam melhor acompanhamento da saúde da gestante e do bebê - identificando possíveis problemas que podem ser solucionados e tratados ainda na gravidez. 

No time dos papais ansiosos estão a sinimbuense Carina Bublitz, de 37 anos, e o vera-cruzense Daniel Sehnem, de 40. Com 10 semanas de gestação, Carina realizou o exame de sexagem fetal (saiba mais abaixo) – tecnologia recente -, em 4 de janeiro de 2021. O resultado fora conhecido apenas pela sua irmã e duas primas que organizaram o chá de revelação no dia 16 - quando os pais e familiares bem próximos souberam que Augusto Bublitz Sehnem estava a caminho. “Desde quando descobrimos a gravidez criamos essa expectativa, talvez por sermos pais de primeira viagem e, por isso, não esperamos pela ecografia para saber o sexo”, revela. 
Tamanha era a ansiedade que rolaram até pedidos para que as dindas de Augusto contassem qual era o sexo do bebê antes do chá revelação, uma enquete entre amigos e familiares que deram seu palpite, além de diversas brincadeiras no dia da revelação mencionando aqueles que eram do time Augusto - caso tivessem palpitado por menino - ou do time Helena - se fosse pela menina. 

EXAMES DISPONÍVEIS

Após algumas semanas, Carina confirmou a espera de um menino em uma ultrassonografia. Se não tivesse optado por saber precocemente, o sexo do bebê teria sido revelado através do exame de ultrassom, a partir da 14ª semana de gestação. Conforme o médico responsável técnico da Bild Clínica de Ultrassom, Diego Melo Furquim, com tamanha tecnologia à disposição médica torna-se inadmissível realizar o exame no tempo correto - quando o genital do bebê já está formado -, e não detectar o sexo. “Claro, a ecografia é um método artesanal, depende da qualidade do equipamento, do treinamento do médico que executa e do paciente. Pode haver dificuldade quando a gestante fez muitas cirurgias abdominais, é obesa, tem pouco líquido amniótico, ou quando o nenê fica muito tempo de costas ou mesmo de frente, com o genital escondido. A alternativa nesses casos é a gestante voltar para reexaminar”, explica. “Gosto de fazer uma comparação da ultrassonografia com um carro: tem carro bom e ruim, tem motorista bom e ruim e tem pista boa e pista ruim. Tudo isso influencia em um bom resultado”, acrescenta. 

Além de saciar a curiosidade, o médico ginecologista e obstetra Telmo Padilha Garcia observa que em certos casos o benefício em descobrir precocemente o sexo da criança está relacionado ao histórico familiar dos pais e doenças ligadas ao sexo. “Um exemplo é a hemofilia [distúrbio em que o sangue não coagula normalmente] que só acomete meninos. Também há outras más formações relacionadas ao sexo e que são ligadas ao cromossomo Y, então, se é menina não vai haver a doença nesse nenê”, esclarece. 
Segundo o profissional, saber se é menino ou menina mais cedo é uma decisão particular de cada casal. Em alguns casos, espera-se até a 22ª semana de gestação, quando é realizada a ecografia morfológica, que verifica a formação do bebê e dos órgãos. Mas no geral, frisa ele, muitos seguem o perfil de Carina e Daniel. “Minha mãe e minha sogra souberam do sexo dos filhos apenas no dia em que nasceram. Há um certo tempo as gestantes esperavam até as 20 semanas e, hoje, eu com 10 semanas já soube”, conta Carina que, junto ao marido, está finalizando o quarto onde até o fim deste mês já devem estar embalando e ninando Augusto.

COMO É FEITA A SEXAGEM FETAL

A responsável pelo Laboratório Flach Bioanálises, Silvane Meert Martin, explica que a sexagem fetal pode ser realizada a partir da 8ª semana de gestação. A partir da coleta de sangue da gestante é possível visualizar amostras de fragmentos do DNA do feto e identificar se há presença de cromossomo Y. “Se identificado o cromossomo Y trata-se de um menino e, caso contrário, é menina”, explica, ao citar que o resultado fica pronto entre sete e 10 dias.  E se a gravidez for de gêmeos? Silvane esclarece que quando a gestação é univitelina - bebês dividem a mesma placenta – o resultado vale para ambos. Porém, se a gestação for bivitelina - quando há a formação de duas placentas – há parcialidade no resultado, e a gestante pode realizá-lo cerca de duas semanas após a primeira coleta para ter mais precisão. Vale ressaltar que nessa condição se identificada a presença do cromossomo Y é sinal de que pelo menos um dos bebês é menino, porém, se não mostrar esse cromossomo, significa que se trata de duas meninas.

Diagnóstico precoce salvou a vida de Théo

Para o médico responsável técnico da Bild Clínica de Ultrassom, Diego Melo Furquim, a evolução da ultrassonografia nos últimos anos se dá tanto em relação à formação das imagens quanto do seu aproveitamento. “Significa que essas informações são cada vez melhor utilizadas em prol da saúde da mãe e do bebê. Nos anos 90, o método da ecografia não tinha imagens tão boas, o leque de diagnósticos era menor, nem se pensava em fazer triagem de parto prematuro ou pré-eclâmpsia. Isso é uma das maiores evoluções da ecografia nos últimos anos e tem que ser utilizada nos pré-natais”, afirma. Segundo o profissional, que atua na área há 18 anos, muito além de ver o formato do rosto da criança ou mesmo se é menino ou menina, a tecnologia empregada hoje na ultrassonografia possibilita saber se os genitais e os órgãos do bebê estão bem formados. “O bebê é escaneado da cabeça aos pés em busca de alterações, como a má formação propriamente dita, quando não tem uma mãozinha ou possui um defeito cerebral ou cardíaco, por exemplo. Outro tipo de achado são marcadores, ou seja, características dos bebês que não necessariamente traduzem doenças, mas aumentam os riscos de desenvolvê-las, como a idade avançada da gestante”, esclarece. 

A realização dos exames nos períodos indicados e com bons profissionais evita uma possível “caixinha de surpresas” após o parto, bem como permite, se identificada a doença ou problema de saúde no nenê e na mãe ainda na gestação, buscar soluções e tratamentos para reverter a condição. “Além do ponto de vista psicológico, de você elaborar o luto - porque a gestante idealiza aquele filho perfeito -, é preciso esclarecer que problema é esse, o que vai acontecer, quais são as opções, se precisa de uma segunda opinião. Investigar se esse problema tem relação com doenças genéticas e aconselhar aquela família de uma forma muito clara e completa”, salienta. 

DIAGNÓSTICO PRECOCE

Dessa forma aconteceu com Camila Altmeyer, hoje com 31 anos, de Cachoeira do Sul, durante as consultas e exames do pré-natal. Na 20ª semana de gestação, ao realizar uma ecografia morfológica, sua médica identificou uma diferença de tamanho entre os dois lados do coração do nenê. Foi então que Camila foi aconselhada a realizar um ecocardiograma fetal, que revelou que Théo tinha uma cardiopatia congênita, denominada coarctação da aorta + CIV. “O Dr. Diego explicou que o Théo teria que nascer em um hospital de referência e que provavelmente se tratava de um caso cirúrgico. Foi um baque muito grande pra toda nossa família, porque sabíamos dos riscos e dos desafios que teríamos que enfrentar”, conta a mãe.  

Por aconselhamento de Diego, com 28 semanas de gestação repetiu a ecografia com um médico especialista, contudo, o profissional descartou qualquer problema de saúde relacionado ao bebê. Dessa forma, Théo nasceu no dia 12 de março de 2020 através de uma cesariana de urgência, pois seus batimentos cardíacos caíram consideravelmente. “A todo o momento falei para o médico que fez meu parto sobre o diagnóstico que o Dr. Diego tinha me dado, mesmo que o problema tivesse sido descartado por outro profissional. De toda forma, eu estava em alerta para essa situação”, recorda Camila. 

Apesar de nos primeiros dias de vida Théo estar (aparentemente) bem, uma semana depois do parto começou a apresentar alguns sinais, como taquipneia e cor arroxeada em volta da boca. Durante atendimento no hospital, os pais mostraram a ecografia realizada ainda na gestação para o médico, que internou a criança na UTI e realizou um exame de ecocardio – que identificou a coarctação da aorta, tal como no primeiro diagnóstico. “A médica da UTI me olhou e disse: ‘Camila, se você não tivesse esse exame com essa suspeita, nunca imaginaríamos que seria esse o problema’”, relembra. 

DEPOIS DO SUSTO

Com o diagnóstico, Théo realizou a primeira cirurgia com 14 dias de vida e a última em março desde ano, com um ano de idade. Hoje, comemora a mãe, apesar de ser um cardiopata é uma criança muito sadia. “Por isso, eu falo para todas as grávidas que conheço o quanto é importante realizar os exames no pré-natal, entre eles o ecocardio fetal. Hoje, infelizmente o SUS não possibilita às mamães fazerem esse exame, mas mesmo sendo de forma particular é de extrema importância e salvou a vida do Théo”, aconselha. 

Diego reforça que existem datas corretas de realizações dos exames durante o acompanhamento gestacional, sendo que cada pré-natal deve ser personalizado, pois cada mãe ou família tem um histórico diferente. “Então se faz extremamente importante seguir as consultas médicas, bem como os exames, que são complementares no pré-natal e salvam vidas”, arremata.

Sem os aparelhos modernos, como era feito o pré-natal?

Médico ginecologista e obstetra há 49 anos, Telmo Padilha Garcia recorda bem da época em que os pais só descobriam o sexo do bebê após o nascimento. Na falta de exames mais avançados, conta que os testes para palpitar se o nenê seria menino ou menina faziam sucesso. “Tinha o da agulha, que conforme o movimento do objeto indicava se era menino ou menina, o do copo, da aliança e assim por diante. Tinha também quem olhava o formato da barriga e já fazia seu palpite. Se formos analisar, a margem de erro era de 50%”,  brinca ele. 

Mas sem a tecnologia que se tem hoje, como então os profissionais acompanhavam a saúde da mãe e do bebê na gestação? Telmo explica que o pré-natal consistia, principalmente, em conversar e olhar com atenção para a paciente para saber se estava bem, observar seus sintomas. “Acolhíamos ela de maneira afetuosa e solicitávamos alguns exames básicos, como hemograma, de urina, glicose, sífilis - o de HIV só surgiu após, nos anos 80. Outra atenção que se tinha era em relação à rubéola, porque havia muitas crianças comprometidas pela doença. Aí, também observava se o pé inchava, media a pressão e fazia o exame pélvico”, recorda ele, ao citar que pelas limitações não era possível, por exemplo, observar a formação dos órgãos. 

Batimentos do bebê

Com 20 semanas de gravidez chegava a hora de escutar os batimentos cardíacos da criança, porém, de uma forma diferente do que acontece hoje. Para tanto, Telmo conta que utilizava um aparelho chamado estetoscópio de Pinard: posicionava uma das superfícies sobre o abdome da mãe e na outra escutava os ruídos produzidos pelo feto. “Apenas uma pessoa por vez escutava os batimentos cardíacos do bebê, mas a mãe não era uma delas, pois não tinha como se posicionar para tal”, relembra, ao citar que na década de 80 isso mudou, quando adquiriu um ultrassom portátil da marca Sonicaid - importado da Inglaterra. “Aí sim, as mamães passaram a vivenciar o momento lindo de escutar o coraçãozinho dos seus filhos”, complementa. 

As evoluções tecnológicas que vieram para trazer mais precisão no acompanhamento pré-natal são recentes, aponta ele, muitas delas a partir dos anos 2000. “O primeiro equipamento de ecografia que conheci foi na Santa Casa de Porto Alegre, no fim da década de 60. Era um aparelho simples, grande, que ocupava meia sala e funcionava bem, mas era mais usado para o diagnóstico de problemas abdominais, nem tanto para obstetrícia. Mas com o tempo foram sendo desenvolvidas técnicas mais modernas e os equipamentos foram melhorando de tal forma que hoje temos essa tecnologia a nosso favor, contudo, sem deixar de lado aquele olho no olho com a paciente e a escuta, tão importantes quanto”, observa.


Foto: Jornal Arauto / Taliana Hickmann
Carina soube o sexo do bebê com 10 semanas de gestação
Carina soube o sexo do bebê com 10 semanas de gestação

Foto: arquivo pessoal
Théo saudável e feliz hoje com um ano
Théo saudável e feliz hoje com um ano

Foto: Jornal Arauto / Taliana Hickmann
Diego atua há 18 anos na área
Diego atua há 18 anos na área

Foto: Jornal Arauto / Taliana Hickmann
Nas mãos, Telmo segura o estetoscópio de Pinard
Nas mãos, Telmo segura o estetoscópio de Pinard