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"Parece que a qualquer momento ela vai voltar", diz irmã da santa-cruzense Gabriele Kuester


Publicado 11/03/2021 19:30

Geral   HOMENAGEM

O coração de Gabriele Maribel Kuester parou de bater na madrugada desta quinta-feira (11) após dias de sofrimento pelas dores causadas por um câncer no útero e os problemas pulmonares ocasionados pela Covid-19. Entretanto, embora seu corpo tenha parado de responder, sua alma continuará viva tanto no céu quanto nos corações dos familiares e da multidão de amigos que colecionou em 36 anos.

Monitora em uma creche de Santa Cruz do Sul, seu brilho e encanto eram percebidos pelos pequenos alunos e pelos familiares que logo notavam o quanto ela era especial para as crianças. Esse sentimento carinhoso que tantas pessoas nutriam por ela era sentido pela irmã de Gabi, Franciele Mariel Kuester. "A Gabi era tão amada pelas pessoas, tão adorada, tão querida. Era a menina do sorriso no rosto, do brilho no olhar", relembra.

Inseparáveis, as duas últimas semanas foram sem abraços para as irmãs. Franciele, que tem um bebê, não conseguiu acompanhar a irmã no hospital quando ela foi internada após a descoberta do câncer. Alguns dias depois, com o diagnóstico positivo para Covid-19, Gabi teve que enfrentar seus últimos momentos longe da família, do namorado e do filho de 14 anos. "Ela entrou em desespero por ter que ficar sozinha, acho que agravou mais", lamenta.

A infecção por Covid-19 aconteceu após sua imunidade ficar baixa depois da primeira sessão de quimioterapia. "Os pulmões dela foram enfraquecendo e ela precisou de oxigênio no fim de semana. O raio-x mostrou uma mancha no pulmão, ela foi isolada e desde ali ninguém mais da família conseguiu ficar com ela. A Gabi foi enfraquecendo, perdeu a consciência. Ficava dopada praticamente. Infelizmente, nessa noite ela não resistiu", conta. "Foi muito difícil não poder mais vê-la, não poder se despedir, mas fica a lembrança do brilho no olhar. Dói muito não poder visitar uma pessoa que você tanto ama", salienta.

Na noite desta quarta-feira, uma ligação do hospital comunicou à família de que não havia mais nada, da parte clínica, a ser feito. Apenas um milagre salvaria Gabi. E por mais que Deus tenha escolhido a levar para perto dele, sua partida foi regada por orações daquela multidão que sempre a amou. "A mobilização nas redes sociais foi linda por uma corrente de orações. Só podemos agradecer aos amigos dela, às pessoas que oraram, à família do namorado e à nossa. Ela estará sempre viva no calor de nossos corações", fala. 

Uma trajetória de batalhas

Em 2015, Gabriele foi diagnosticada com um meningioma, tumor benigno que pode crescer tanto pra fora quanto para dentro da cavidade cerebral. O dela estava crescendo para dentro e poderia comprometer funções cerebrais. Para salvá-la, os médicos a conduziram para uma cirurgia que poderia ocasionar sequelas ou até mesmo sua morte. Para o alívio e a alegria da família, tudo deu certo. 

Após uma recuperação tranquila, Gabi apenas fazia acompanhamentos, pois parte do tumor havia permanecido. Um dia, talvez, ela precisaria operar novamente, mas sem previsão de quando, pois o tumor estava crescendo lentamente. Porém, em 2019, os sinais de um câncer começavam a aparecer, sem que a família conseguisse decifrar.

Isso porque durante uma consulta de pré-câncer, a monitora foi diagnosticada com infecção e a liberaram para fazer um tratamento básico em casa. Nesse meio tempo, iniciou a pandemia, as idas ao médico diminuíram, mas os sintomas continuaram. Em janeiro de 2021, Gabi teve um inchaço na perna, que também foi avaliado como infecção.

Dias antes do carnaval, o inchaço reapareceu, ela foi ao plantão e foi avaliada como suspeita de trombose, posteriormente descartada. Após uma série de exames, uma médica aconselhou sua internação, mas o médico plantonista seguinte achou melhor ela aguardar os resultados em casa. Os dias passaram e ela passou a sentir muitas dores nas costas, nos rins e teve um sangramento que assustou toda família.

Foi quando ela fez uma ecografia particular e o médico não conseguiu visualizar os ovários e o útero devido ao inchaço. Numa consulta seguinte em uma ginecologista, o câncer de útero - já num estágio avançado - foi diagnosticado. Com o passar do tempo, mais sangramentos, inchaços e desmaio, Gabi conseguiu uma vaga de internação, mas passou a registrar anemia e começou a perder funções renais, o que também necessitou hemodiálises. 

36 anos de intensidade

O que acalma os corações dos familiares de Gabriele é a forma intensa na qual ela viveu seus dias. Aliás, Franciele acredita que esse foi o maior legado deixado pela irmã: não se preocupe tanto em trabalhar para guardar dinheiro e comprar bens materiais. Gabi sempre mostrou o quanto é importante viver, sentir, aproveitar, ser feliz. E ela foi. Todo mundo que a conheceu sabe.

Da mesma forma que era intensa e não se preocupava com a opinião dos outros, era receptiva, carinhosa e tinha um cuidado muito grande na forma de tratar as pessoas. "Ela fazia as pessoas se sentirem bem e amadas. Ela tratava todos com muito carinho e a recíproca era grande. Ela vivia feliz, do jeito dela. Ela não procurava aprovação das pessoas, ela só queria ser feliz. Ela fazia as coisas com o coração", comenta.

"E se não houver outra vida, essa vida você viveu?". Essa era a frase que a irmã acredita que Gabi sempre pensava. Afinal, viveu todos os seus dias como se fossem os últimos. "Ela amava festas, viagens, passeios, amigos, piscina. Como ela adorava piscina! O mar! Ela aproveitou o máximo enquanto conseguiu. O sorriso dela vai fazer muita falta aqui", afirma.

Por fim, restam as lembranças de uma vida com Gabi, repleta de felicidade, intensidade e amor. "Vai ser muito difícil. A ficha ainda não caiu. Parece que a qualquer momento ela vai voltar e que tudo não passou de um sonho. O sentimento que fica é que ela não está mais sofrendo e que agora está sendo amparada e recebida por inúmeras pessoas que partiram antes e querem o seu bem. A ferida vai doer e sangrar por um bom tempo, mas eu tenho certeza que o brilho no olhar, o sorriso e o bom coração dela sempre estarão com a gente. Gabriele vive em nós", diz. 


Foto: Arquivo Pessoal
Gabi e Fran, irmãs de sangue e de alma
Gabi e Fran, irmãs de sangue e de alma