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Santa-cruzense revela como reconquista da autoestima auxilia no enfrentamento do câncer


Fonte: Jornal Arauto
Publicado 06/10/2020 21:00

Geral   OUTUBRO ROSA

Em 16 de abril deste ano, dia do seu aniversário, a santa-cruzense Telma da Silva Marques, de 58 anos, recebeu o resultado dos exames que mudariam sua vida para sempre. Foi diagnosticada com câncer de mama. A notícia gerou apreensão e medo, sentimentos que, conforme a psicóloga da Associação de Apoio a Pessoas com Câncer (Aapecan), Grasiela Lopes, acometem muitas mulheres que passam por esse processo. “São angústias ligadas à feminilidade, maternidade e sexualidade, já que o seio é um órgão repleto de simbolismo para a mulher. Nesse sentido, começa uma nova compreensão do que é ser mulher, uma descoberta interna do que é importante na expressão feminina”, pontua. E para Telma é assim que podem ser definidos os últimos meses, como tempo de descobertas.

Apenas alguns dias após realizar a primeira sessão de quimioterapia, os cabelos da santa-cruzense começaram a cair. Pouco tempo depois, resolveu raspá-los de vez. Desanimada com tudo o que ainda enfrentaria por causa da doença, buscou atendimento junto à Aapecan e se sentiu acolhida. “Conversei com a psicóloga e ela me mostrou novas perspectivas, muito além da doença”, recorda. “Então, passei a pensar no apoio que recebia dos meus filhos, nora, neto, e companheiro, e vi o quanto isso era valioso”, revela. A partir disso, algo mudou dentro de Telma, fazendo-a relembrar o quanto era vaidosa e gostava de usar batom e lápis no olho. Decidiu, então, não deixar isso para trás. O primeiro passo foi usar peruca. “Usei por um tempo, mas não me adaptei. Aí, comprei um turbante azul, cor que gosto muito. Percebi com isso, que não é o cabelo que me define como mulher, sou muito mais”, frisa.

UM NOVO OLHAR

Conforme a psicóloga da Aapecan – instituição que atualmente atende 116 pacientes com câncer - quando se trabalha a autoestima da mulher, ela fica mais fortalecida e empoderada para enfrentar o tratamento e até mesmo a vida de uma forma mais positiva. “Isso reduz os sintomas emocionais e físicos causados pelo câncer e o tratamento, o que possibilita que a mulher ressignifique a experiência do adoecer”, esclarece. 

Telma reconhece que o enfrentamento da doença não é fácil. Há seus altos e baixos. No entanto, ao se possibilitar viver o momento com um novo olhar, se redescobrindo como mulher, mãe, avó e companheira, sem deixar de lado a autoestima, se sente ainda mais fortalecida para enfrentar os desafios dessa caminhada. 

TRABALHO DA AAPECAN

Além de oferecer apoio emocional através de grupos ou atendimentos individuais, a Aapecan trabalha diferentes atividades relacionadas à autoestima das usuárias, como um espaço planejado para acolhê-las, onde se reconhecem e se reinventam através da escolha de peruca, lenços e produtos de beleza. Além disso, outro projeto é o Camarim da Autoestima, através do qual voluntários se propõem a cuidar da beleza das usuárias. Atualmente, devido à pandemia, os grupos não estão sendo realizados e, no Camarim da Autoestima, ocorre somente o empréstimo de perucas.  

Como trabalhar a consciência ativa em relação à peruca na comunidade

No processo de redescoberta da autoestima de mulheres em tratamento contra o câncer, o lenço, o turbante e a peruca auxiliam a amenizar o abalo emocional que vem junto à queda do cabelo. Pensando nisso, há seis anos, o banco de perucas “Fios de Esperança” empresta perucas feitas de mechas naturais a pacientes em tratamento no Hospital Ana Nery, em Santa Cruz do Sul. Além de apoiadores como a Liga Feminina de Combate ao Câncer, o Lions Club Centro e a Clínica do Cabelo, de Soledade – que confecciona as perucas -, o projeto é fruto do trabalho de diversas mãos, que também confeccionam almofadas para suporte do braço das pacientes no momento do pós-cirúrgico e auxiliam na realização dos brechós para arrecadação de recursos para compra de sutiãs pós-cirúrgicos.

Entre essas voluntárias está a cabelereira e visagista Vanessa Manfio. Ela é responsável por fazer a seleção das mechas, a classificação e separação por cores e tipos de cabelo para, então, enviar a clínica onde são produzidas as perucas. “Anos atrás, quando meus filhos passavam por alguma mulher sem cabelo na rua, perguntavam se ela estava doente. Isso me fez refletir sobre o olhar das pessoas para pacientes com câncer, além de me sensibilizar com o fato de mulheres carentes não terem acesso a perucas”, explica Vanessa. Ela cita que, em função da pandemia, a movimentação em torno dos brechós e da seleção das mechas estão suspensas e, que por isso, o estoque de cabelo não carece de doações neste momento. Mesmo assim, salienta que as perucas continuam disponíveis para empréstimo.

 Para Vanessa, fazer a diferença na vida de uma paciente com câncer diz respeito a tornar o aspecto da peruca uma consciência ativa, despertando o afeto das pessoas para um olhar carinhoso. “A paciente oncológica quer ser tratada com naturalidade. Quer se sentir forte, empoderada. Isso facilita a aceitação dos pacientes e familiares a respeito da doença, pois o preconceito, muitas vezes, acaba fazendo com que as pessoas adoeçam ainda mais”, esclarece. “A quem se afaste de uma pessoa que está passando pela doença por não saber como lidar, mas esse auxílio pode ser simples, seja se oferecendo para ir ao mercado, dando um bom dia ou olhando para esse paciente com mais carinho”, aconselha.


Foto: Jornal Arauto / Taliana Hickmann
Telma reconquistou sua autoestima
Telma reconquistou sua autoestima

Foto: Jornal Arauto / Taliana Hickmann
Banco de Perucas do Hospital Ana Nery empresta perucas para pacientes com câncer
Banco de Perucas do Hospital Ana Nery empresta perucas para pacientes com câncer